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Caldeirão da Bolsa

Conto do mar do Norte (é de maior fôlego - vamos lá ver)

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

De fino recorte literário...

por Curioso » 13/3/2003 18:55

... a tua observação, Peninha...

Obrigado, ahahah...
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Hidrogenio

por Peninha » 12/3/2003 2:33

Que uma borboleta....seja uma flor com asas...
... ....
Agora um beijo... um suspiro dos lábios, ... não lembra a um tinhoso.
:|
Formatando. .... %Positivas p´ra ti.
Peninha
 

por Avermelhado » 12/3/2003 1:35

Na sua pressa estremunhada passou junto à lareira sem se aperceber que do pregrino só restava o lugar........
Avermelhado
 

Vá lá...

por Curioso » 11/3/2003 21:34

... digam ao menos se gostaram...
Tá bem? :oops:
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Estava um bocadinho escondido...

por Curioso » 11/3/2003 18:56

:) :wink:
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Eu sei...

por Curioso » 11/3/2003 15:33

... o Principezinho também já me disse isso...

(gostei!)
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por Pata-Hari » 11/3/2003 11:07

Olha, curioso, isto é problemático, se nos habituas às tuas histórias, depois ficas responsável por cuidar de nós quando começarmos a exigir mais e mais com regularidade :P :P

Olha que se fica responsável por quem se cativa, lol!
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Ah!! Desse gosto

por Avermelhado » 11/3/2003 2:38

Tem mar,borboletas,flores,marsia maritima ; um sem número de fantasias que obrigam um homem a sonhar acordado. É o feeling do paraíso à beira mar plantado, de um jardim onde não faltam flores : vermelhas se possivel, para recordar as vitórias unidas dos jardineiros,soldados , marinheiros e trompeteiros!
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Conto do mar do Norte (é de maior fôlego - vamos lá ver)

por Curioso » 11/3/2003 2:02

Conto do mar do Norte

A noite ainda se debateu ligeiramente, mas pouca força tinha perante o crepúsculo matinal que espreitava sobre o mar. Devagar, devagarinho, o Sol estendeu os seus raios de luz, como se se espreguiçasse, deliciado, sobre o azul das águas, seguindo a maré ao encontro do beijo da terra. A torre da igreja foi a primeira beneficiada com as originais luminescências que a recente manhã trazia. Não era nada de novo, afinal continuava a ser um nascer do dia como outro qualquer. Como de costume, das casas ainda escondidas do amanhecer, alguns homens começaram a dirigir-se para os campos. O Sol atrasava-se sempre perante eles. Por vezes, até a noite ficava envergonhada por ser ultrapassada por aqueles humanos que desafiavam os contadores de tempo e, ainda o escuro se mantinha sólido e firme sobre as arribas e fajãs, já os homens terminavam os seus preparativos, chamados matinais mesmo que ainda à noite se façam, e abalavam para os terrenos, ainda orvalhados, ao fim e ao cabo, o ventre da Terra à espera da monda, da semeadura, do cultivo que sazonalmente a isso obriga a labuta agrícola que alimenta aquela gente que tem que ignorar o mar...

O mar... outra terra por lavrar, por mondar, mesmo ali em frente, à chamada mão de semear, que neste caso mais seria de colher, e, no entanto, escondidas sob a espuma, nunca as podemos ver daqui, erguem-se para o céu, em esforço, como seres vivos a tentarem respirar, as rochas, garras, que também este ventre da terra inventou. Quedam-se imóveis, embora não pareça, à espera, têm todo o tempo do mundo, que alguém, imprevidente, as afronte, e se faça às águas para tentar trazer os frutos que poderiam fazer variar um pouco a dieta, não vegetariana, embora as coisas modernas tenham algumas vantagens, mas que mais barata e útil seria se fosse possível acrescentar aos pratos um bodião, um besugo ou um atum, que às vezes também se extraviam dos seus cardumes e se perdem nas redes dos homens, mesmo que avisados estejam. Já toda a gente sabe que os grandes acabam sempre por comer os pequenos, mas a memória é curta, e é como se as palavras se diluíssem na água.

Com tudo isto, o Sol já nasceu, em todo o seu esplendor. Nas ruas, que os homens já partiram para os campos, vêem-se mulheres, crianças poucas, a escola já chamou a maior parte e algumas, mais atrasadas, apressam-se para não receberem um olhar de censura da professora que já começou a enunciar o alfabeto, se calhar já passou pelos algarismos, vá-se lá saber, que estamos atrasados, e detesta ser interrompida, principalmente pelo gemido da porta quando se abre, já era tempo de alguém pôr um pouco de óleo naquelas missagras, que todos os dias choram e que ninguém parece ouvir...

Os caminhos, desta vez, não vão todos dar a Roma, mas sim ao centro da povoação, é hora, como se o tempo ainda tivesse horas ou as horas tempo, de abastecer a despensa, aí está o fundamental e necessário trabalho dos homens, que lá foram para os campos, de outras jornadas veio aquilo que a terra deu e que estas mulheres vão procurar adquirir para juntar ao que têm em casa, de modo a que a refeição do meio-dia, que ainda demora mas que já preocupa, tenha um pouco mais que uma batata doce, uma semilha, umas folhas de couve, que o quintal, nas traseiras, ainda é generoso, e possa ser composto por uma peça de entrecosto, ou, quem sabe, vindo das águas que noutras paragens se apresentam mais serenas, perderam-se as rochas aqui e aqui ficaram, um peixe que, bem dividido, chegue para toda a família, ou mais alguém, nunca se sabe quem vai entrar por essa porta dentro, mas quem vier será bem-vindo, e nada lhe faltará do que para nós exista...

É noite de novo. Batem à porta. Uma chamada suave, quase tímida, como a não querer incomodar mas sem ter outra hipótese, está-nos sempre a acontecer. Ou porque esquecemos o relógio, ou porque não sabemos onde estamos, ou porque nos sentimos sozinhos e um rosto que nos ouça, uns olhos que nos respondam, por vezes, são suficientes.

O chefe da família, ainda assim a sociedade impõe ao homem esse epíteto, faz sinal com a cabeça. A mulher levanta-se e, curiosa, abre a porta. Lá fora, aquilo que parece um peregrino aguarda humildemente. Um cocho de água é suficiente para o caminho se fazer, de novo, perante ele, que, todos sabemos, o caminho faz-se andando e a história escrevendo...

Por aqui se poderia confirmar que o silêncio, ao contrário do que dizem, nunca foi bom conselheiro. É nessas alturas que os inimigos aproveitam para lançar as suas farpas. Se estás calado nada tens para me dizer; direi eu e terás de me responder! Mas não é este o caso. O peregrino, chamemos-lhe assim, só precisa de um pouco de água, confirma ele a nossa sugestão, para retomar o caminho, ainda não sabemos para onde, é sempre o mesmo problema, queremos saber tudo e acabamos por não saber nada, ou do que conhecemos muito pouco sabemos aproveitar.

Que entre, se sente e se sirva; nunca ninguém nesta casa ficou à porta ou jejuou quando a família se alimentava, e isto talvez o dono da casa não tenha dito, está implícito na esposa e nos oito filhos que impacientemente esperam que o impasse se resolva, para que o interesse se volte para os pratos que aguardam, estes pacientemente, são pratos, não têm vontade, pelos cuidados que diariamente lhes são dispensados.

Entrarei, disse o peregrino. Não seria correcto recusar tão grande generosidade da parte de quem, dificultosamente, põe todos os dias, na mesa, a subsistência para toda a família.

E entrou! Lá fora ouvia-se o vento e o mar. Estavam também à porta mas não queriam entrar. Eram parte da noite que se abraçava a si própria, a ganhar força, mas ficavam lá fora, o seu mundo tinha outras fronteiras e, embora por vezes penetrem no mundo dos Homens, sabem até onde podem ir e, quase sempre, por lá ficam.

Sentou-se mais uma alma a esta mesa, o que para dez é suficiente chegará para onze, o que quer dizer que os estômagos irão dormir mais vazios que o habitual e um, o do peregrino, mais cheio do que esperaria. Ali, naquele espaço, junto à lareira que ainda arderá umas horas, vai repousar este homem, que ninguém conhece mas a quem não foi recusado nem água, nem comida, nem descanso.

De novo, a escuridão vai libertando do seu abraço os campos, a torre da igreja, a praça onde, a pouco e pouco, a vida vai voltando. Estranhamente, o sono desta família foi profundo. Não é usual. Dez corpos que respiram em três divisões, sabendo nós que uma serve de sala e de cozinha, não costumam dormir o melhor dos sonos. Há sempre pesadelos que fazem parte da noite e que se acomodam a alguns locais. Mas, por vezes, as coisas mudam. A casa parece ter deixado de sentir as brechas que aumentam todos os Invernos. É como se o calor da lareira fosse mais forte do que tudo o que vinha do exterior, ou talvez não...

Já o Sol ia alto quando o pai e marido abriu os olhos, espantado, para os raios de luz que ousavam assomar pela janela. O campo esperava por ele e estava atrasado. Como era possível ter-se deixado dormir assim? Não incomodou a mulher, nem os filhos, que continuavam mergulhados no sono que, apesar de todas as vicissitudes, acabava por ser reparador e sempre os transportava para o dia seguinte.

Na sua pressa estremunhada passou junto à lareira sem se aperceber que do peregrino só restava o lugar. Arrumado e limpo, podemos referir sem quebrar o ritmo da história. Do peregrino nada...

Vai célere o agricultor em direcção ao pedaço de terra que alimentava a família durante metade do ano.

Aí chegado julgou ainda não ter acordado. Ficou estático, pasmado, olhando o que ontem era terra castanha, hoje um mar de verde que se estende perante os seus olhos. Demorou um pouco a recompor-se e a apreciar o campo que, ainda há pouco, tinha cultivado. Sentiu cada couve, acariciou cada pé de milho, ouviu as razões de cada inhame... e continuou sem conclusões.

A natureza tinha-lhe dado num dia, nalgumas horas, o que costumava demorar semanas.

Quedou-se um pouco mais a encher a vista de respostas para as quais não tinha perguntas. Às que tinha, ninguém lhe podia responder.

Voltou para casa inquieto. A rotina tinha sido quebrada e isso deixava-o desconcertado. Quantas vezes somos sujeitos a pressões deste tipo? Julgamos que o nosso mundo é certo e seguro, está ali, com todos os fundamentos com os quais aprendemos a viver, e, de repente, cai tudo pela base. Tudo aquilo em que acreditávamos desvanece-se e sentimo-nos perdidos. Vamos então ao encontro de quem nos acolha e compreenda.

A mulher esperava-o, assim como alguns vizinhos. As boas como as más notícias depressa se espalham e todos pretendiam saber como ele tinha conseguido domar a natureza de tal forma. Queriam partilhar um segredo que nem ele sabia qual era.

À falta de explicação começaram a ficar desconfiados e a achar que o, até aí, bom vizinho não passava de um egoísta que queria a boa fortuna só para si. Quem somos nós para tentar explicar a psicologia das massas. Ainda mais agora que, de repente, vêem um dos seus melhor na vida, que bem nunca se está, sem necessitar da labuta quotidiana para suprir as necessidades do dia-a-dia.

Confuso, entrou em casa e dirigiu-se à lareira para tentar espantar o frio que, repentinamente, lhe tinha acariciado os ossos. Reparou, nesse momento, no lugar vazio que no seu íntimo julgava ainda ocupado. Foi então que a mulher lhe contou que, pela madrugada, alguém tinha visto uma pessoa, cuja discrição coincidia com o aspecto do peregrino, a seguir rua abaixo, ao longo da ribeira, até ao calhau, onde o mar se juntava com o caudal de água doce que descia das montanhas em volta. E era estranho, segundo tinham contado. Num momento estava ali, como se esperasse algo, e logo a seguir tinha desaparecido, no exacto momento em que os primeiros raios de sol se estendiam sobre o mar, criando um espelho que, durante longos segundos, não deixava ver coisa alguma. Da presença do suposto peregrino só tinha ficado uma pedra negra, altaneira, como que vigiando o mar, que ninguém sabia de onde tinha vindo, nem sabiam explicar como ali tinha chegado, que de tão pesada vários cavalos e dezenas de homens seriam necessários para a mover.

Admirou-se o marido com a história que agora ouvia, mas pouca coisa nesta altura o poderia espantar, e decidiu percorrer pelos seus próprios passos, para ver com os seus próprios olhos, o que o viajante da madrugada tinha percorrido e visto.

Chegou à rocha negra, chegou ao mar. Ou o mar chegou até ele. Nunca nos apercebemos se quando caminhamos vamos ao encontro de algo ou se, pelo contrário, é isso, trazido pelas voltas do planeta, que se encaminha para nós. Mas estava ali, naquilo a que, com boa vontade, ainda se chamava porto. E, junto à pedra lisa, que o sol aquecia e fazia brilhar, o mar pareceu-lhe, estranhamente, muito calmo. Era como se o chamasse, como se a ligeira rebentação ali perto lhe acenasse e dissesse: vem, vem...

E ele foi. Empurrou um dos poucos barcos ainda prestáveis, passou as ondas da beira-mar e remou para o largo. Não escolheu rumo nem destino. Deixou que os braços o levassem até onde sentiu que devia parar. Aí, recolheu os remos e lançou as redes, ressequidas do pouco uso. São as pequenas coisas que fazem os grandes homens. Quem o poderá algum dia explicar.

Nessa noite, a aldeia reconciliou-se com o bom vizinho. Que importava não querer revelar o segredo dos campos se, afinal, tinha trazido peixe suficiente para muitos dias, que distribuíra por todos? Nunca tal se tinha visto nem contado, assim como nunca mais se soube coisa alguma do peregrino.

Não houve, propriamente, uma reunião, nem consta que tenha sido decidido em conjunto, mas toda a comunidade se envolveu e, na manhã seguinte, os homens, as mulheres e as crianças saíram das casas, mas não foram para os campos, o mercado ou a escola. Dirigiram-se à pedra negra, que ali tinha ficado como única testemunha da passagem do viajante que ninguém sabia quem era.

Como forma de agradecimento ao patrono da aldeia, que muitos insinuavam poder ter personificado no peregrino, mesmo ali, na rocha basáltica, no local onde alguém o não tinha visto desaparecer, construíram uma pequena ermida, e tomaram para nome da povoação o do santo que veneravam.

Todos os anos, a partir daí, durante alguns dias, os campos parecem tornar-se mais férteis e é nessa altura que os homens vão lavrar o mar em S. Vicente.
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