Sem ofensa para ninguém, tenho estranhado ver pessoas respeitáveis passarem horas na TV a discutir as ‘Secretas’.
Começo por não gostar do termo ‘Secretas’, e julgo que nunca o usei em títulos nem em textos.
Acho que tem qualquer coisa de piroso e de ridículo, em simultâneo.
Serviços secretos têm os americanos, têm os russos, têm os israelitas; os portugueses têm uns serviços de informações de trazer por casa, que não são para levar muito a sério.
Não o digo gratuitamente.
Estabeleci em certa época uma relação amigável com um director do SIS, que me fez uma extraordinária confidência: a grande tarefa dos agentes era recolherem informação nos jornais, porque não havia dinheiro para mais!
Em tom de queixa, o homem lamentava-se de pouco mais poder fazer do que recortes da imprensa!
Quando eu pensava que ele era depositário de grandes segredos e que ainda me faria revelações bombásticas, o homem confidenciava-me que uma das grandes fontes de informação dos serviços que chefiava era, afinal, o jornal de que eu era director!
Mas o que ficámos a saber da dita polémica sobre as ‘Secretas’, que salpicou o Verão?
Após várias manchetes e dezenas de páginas de jornais sobre o tema, depois de horas e horas de debate nas televisões, o que se concluiu?
Por junto, muito pouco ou quase nada.
Soube-se que um ex-director do SIED, que há um ano transitara para a Ongoing, forneceu informações a este grupo.
Mas não se soube bem que informações foram, para além de uns dados sobre empresários russos…
Soube-se ainda que o SIED bisbilhotou a lista de chamadas telefónicas de um jornalista do Público que escrevia sobre os serviços de informações.
Alegadamente, tentavam saber qual era a fonte do jornalista dentro dos serviços.
Mas, sendo isto ilegal e condenável, não deixa de ser compreensível que um serviço de ‘espionagem’ que suspeita estar a ser ‘espiado’ queira identificar o ‘espião’ infiltrado.
É o mínimo que pode fazer!
Acresce que essa lista de telefonemas era um segredo de Polichinelo, pois está ao alcance de dezenas de pessoas.
Quer nas operadoras telefónicas, quer nas próprias empresas, há muita gente a ter acesso às listas de chamadas dos jornalistas.
Assim, este caso de espiões e espionagem é uma história de opereta.
A menos que por detrás dele haja algo que nos escape – e que ainda não veio a público.
Uma coisa há – e é pública: a luta pela liderança da Impresa.
Desde 1973, data da fundação do Expresso (que deu origem ao grupo), o líder incontestado sempre foi Francisco Pinto Balsemão.
Sucede que, de há dois anos para cá, o presidente da Ongoing, Nuno Vasconcelos – filho de Luiz Vasconcelos, número de dois de Balsemão durante décadas, entretanto falecido – tem vindo a pôr em causa a liderança de Balsemão, fazendo-lhe graves acusações de má gestão.
Vasconcelos, que detém 23% da Impresa, diz ainda que não o deixam nomear um administrador.
Da luta surda passou-se ao confronto aberto – e há muito que se entrou na fase do ‘ou ele ou eu’.
Ou Balsemão resiste – ou Vasconcelos, que é 27 anos mais novo, lhe tira o lugar.
Esta guerra de contornos parricidas tem lugar numa época de crise (que afecta fortemente as empresas de media, com a queda das receitas publicitárias), quando a dívida da Impresa à banca aumenta e, ainda, quando se perspectiva a privatização da RTP (na qual a Ongoing pode ter interesse se sair da Impresa).
Este assunto, sim, é interessante.
A luta pelo controlo da Impresa, o maior grupo de comunicação social do país, é bem mais importante do que as guerras intestinas de espiões de trazer por casa.
Só que estas guerras se cruzam: a denúncia de que um director do SIED passou informações à Ongoing foi feita por quem?
Pelo Expresso, a jóia da coroa da Impresa.
E, mesmo que todos considerem isso uma coincidência, há pelo menos uma pessoa que pensa o contrário: Nuno Vasconcelos.
Ora isso faz toda a diferença
http://sol.sapo.pt/inicio/Opiniao/inter ... %20S%E9rio