INCÓGNITA
Nunca ninguém descobriu de onde vinham as madrugadas. Pelas cores, uns propunham as margens do arco-íris. Mesmo ali, onde a água se confundia com a luz, presa a infinitesimais pedaços de calor, era onde se formava a manhã, diziam.
Outros defendiam a fímbria dos pensamentos. Que outro local, tão perto da vida, tão distante das vozes, poderia existir para formar o crepúsculo matinal?
Alguns advogavam o florescimento das rosas. Era certo. O momento em que o botão se despendia da cápsula verde para adorar o sol era o local ideal para se formar o novo dia.
Havia quem desdenhasse de tudo isto e reclamasse para si o conhecimento da verdadeira origem do princípio do dia. Sim, sem dúvida. Era nos sonhos dos bebés que crescia a doce iniciação das luzes. Afinal, que lugar mais suave poderia existir para calar a noite?
E assim decorriam os dias, em vigorosos debates sobre opulentas madrugadas de ignotas origens.
Eram despojos oferecidos a deuses que se aninhavam nas palavras dos homens. Sons esparsos e inconstantes de palavras fugidias que não encontravam destino.
Ainda hoje se debate a origem da madrugada.
Ainda hoje se discute o lugar do sonho e o caminho da noite. Passo a passo, desde o cerrar das pálpebras até ao resplandecer da luz, onde os sons são mais difusos, espantados com a claridade de qualquer acordar.