Economia americana trava perigosamente no quarto trimestre

Os analistas começam a inclinar-se para um facto incómodo: a Reserva Federal (Fed) está, de novo, a gerir politicamente a taxa de juro, de modo a empurrar o risco de recessão para o próximo presidente. O corte esta semana de 50 pontos-base no «fed funds rate», o segundo em menos de quinze dias, trouxe o custo do dinheiro no mercado interbancário americano para valores reais negativos. A taxa directora do dólar está hoje nos 3% enquanto a inflação oficial para 2007 já era de 3,9%. Ou seja, a moeda norte-americana está a ser ‘oferecida’, uma terapia conhecida por “morfina à japonesa”, um expediente financeiro que os japoneses usaram, sem grandes resultados, desde os anos 1990.
As autoridades americanas alegam que pretendem diminuir o risco de recessão (decréscimo do produto ou crescimento negativo). Mas este risco é ainda baixo, embora tenha vindo a agravar-se. Segundo a monitorização mensal da economista Marcelle Chauvet, situava-se no final de Dezembro em 13%.
Um desfasamento conhecido
As razões para as preocupações de Ben Bernanke e companhia na Reserva Federal são reais. É que, precisamente no dia em que foi anunciado o novo corte nas taxas, ficava a saber-se que a economia americana cresceu a uma taxa anualizada de 0,6% no último trimestre, Nos três meses anteriores, tinha sido 4,9%.
Em Washington, este número foi suficiente para fazer disparar o alarme e para conseguir uma quase unanimidade no comité responsável pela política monetária: nove votos a favor de um novo corte contra apenas uma discordância. No comunicado da Reserva Federal nunca se fala em recessão mas apenas em nervosismo nos mercados financeiros, aperto no crédito às empresas e às famílias ou desaceleração no mercado de trabalho.
De facto, para já pode falar-se apenas de uma travagem a fundo. Ainda é cedo para falar de recessão. As últimas estimativas do Fundo Monetário Internacional apontam para um crescimento dos EUA em 2008 inferior ao europeu - 1,5% contra 1,6%. Mas não arrisca ainda usar a maldita palavra começada por R.
Aliás, mesmo que o pânico que se tem vivido nos mercados seja um sinal de perigo, a recessão ainda demorará a chegar. A história mostra que os «crashs» bolsistas costumam antecipar. No caso mais recente, entre o estouro do Nasdaq de 2000 e a recessão de 2001 mediou um ano. É esse «timing» conhecido que leva os analistas a suspeitar que a gestão política da suposta ‘crise’ tem um alvo: deixar os ovos podres para 2009.
As galinhas keynesianas
A análise da correlação entre crises bolsistas e crises económicas nos últimos setenta anos mostra esse desfasamento.
O dinheiro barato, lançado pelas ‘galinhas keynesianas’, como lhes chama o analista Nelson Hultberg, nunca resolve os problemas de fundo. Nelson vai buscar o economista Ludwig von Mises (1881-1973), que sempre repetiu o aviso: “Não há forma de evitar um colapso final de um «boom» que foi gerado pela expansão indevida do crédito. As alternativas são apenas duas: ou a crise vem o mais cedo possível como resultado de um acto voluntário de abandono da injecção monetária, ou virá mais tarde, como uma catástrofe total de todo o sistema”.
Como as bolsas conhecem o truque de retardar a bomba, o dinheiro barato não as convence. Por isso, não admira que as praças americanas tenham subido logo após o anúncio da Fed e voltado a cair pouco tempo depois. Na Europa, os mercados também continuaram em queda e aguardam por um empurrão de Frankfurt. A reunião do Banco Central Europeu da próxima quinta-feira é uma das mais esperadas dos últimos anos. Todos querem um corte de juros que ajude a Europa a enfrentar a tempestade vinda do outro lado do Atlântico, mas o presidente Trichet não tem dado sinais de ceder.
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Salvamento encoberto dos bancos espanhóis
O jornal inglês ‘The Telegraph’ noticiava esta semana que a operação ‘encoberta’ de salvamento da banca espanhola afectada pela crise do crédito hipotecário de alto risco já estava em curso, pelo menos há dois meses. Só em cinco casos, o volume já atingia os 11,1 mil milhões de euros, aproveitando a janela de oportunidade aberta pelo Banco Central Europeu. Os três principais casos: o BBVA (4,9 mil milhões), a Caja Madrid (2,4 mil milhões) e a Caja Catalunya (1,6 mil milhões). O jornal acrescentava que os fundamentais de Espanha começam a acender o vermelho: a dívida das empresas é de 112% do PIB e o défice da balança corrente é de 10% do PIB.
Fonte Expresso
Cumprimentos,
CN