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Caldeirão da Bolsa

Conversa Ociosa

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

por Don » 3/6/2004 12:14

Melhor professor que tive na faculdade.
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Conversa Ociosa

por JAG » 3/6/2004 12:12

João César das Neves
Economista

in DN

Conversa ociosa

Esta é a época ideal do pessimismo lusitano: a recessão económica cria sempre muita emoção, zanga e desânimo. Esquece-se que toda a gente sabia que isto ia acontecer, que tantos fizeram tudo para o gerar e que, afinal, até foi menos grave do que se esperava.

Há poucos anos, os analistas estavam de acordo que Portugal acumulava um grande desequilíbrio financeiro. As famílias tinham um endividamento explosivo, o Estado violava limites do défice, as empresas entravam em euforia. O desequilíbrio global do País (medido na balança externa, corrente + capitais) atingiu 9% do produto em 2000, comparável ao de 1977 (8,8%) após a terrível perturbação da Revolução. Como esse desequilíbrio (ao contrário dos anos 70) foi acumulado em tempo de prosperidade, era evidente que seria pago em época de dificuldades, inevitável na normal flutuação do ciclo económico.

Assim, a actual conjuntura era perfeitamente previsível. Qualquer que fosse o Governo, o País teria agora uma posição muito apertada. Aliás, se há algo de surpreendente na actual situação, é que ela não esteja pior. Felizmente, o mundo viveu uma recessão muito menos grave que a expectável. Os escândalos financeiros em multinacionais, a derrocada na bolsa tecnológica, o terrorismo, as guerras e choques petrolíferos, afinal, não tiveram o efeito devastador que era razoável temer, e a crise internacional foi moderada, o que ajudou Portugal nas dificuldades. A nossa queda de produto em 2003 parece ser só de 1,2% e o desemprego ainda não chegou aos 7% que atingiu na última recessão. O atávico pessimismo português tinha razões para esperar bem pior.

Além disso, o desequilíbrio externo vai-se corrigindo, sendo 3% em 2003.

Assim, a situação actual é dolorosa, depressiva, mas não justifica muito do que se diz por aí. Não é preciso imprecar a fatal paralisia empresarial, repetir a eterna lamentação da falta de produtividade, exconjurar o fim do famigerado modelo de desenvolvimento. Trata-se só de uma recessão cíclica, normal na passada corrente da evolução do País.

Outra coisa que não se entende é essa contínua discussão à volta da produtividade. Toda a gente parece concordar que Portugal não tem dinamismo, perde competitividade, atrasa-se na produtividade. Só que, por acaso, as nossas exportações reais cresceram 20% no total dos últimos cinco anos e mesmo no ano passado, ano de recessão, aumentaram 4,1%. Nada mau para pouco produtivos!

O grande erro é muita gente parecer achar que a produtividade é necessária para o sucesso das empresas, do crescimento e da convergência com a Europa.

Esquecem que a produtividade só comanda uma única variável económica, os salários. Não notam que os países do Leste da Europa e Ásia, que tanto os assustam, têm uma produtividade muito menor que a nossa. Mas como os seus salários estão baixos, concorrem e vendem.

O interesse da produtividade não é tanto directamente para a competitividade e o crescimento. Ela é importante, mas para a subida dos salários reais. Que, por acaso, aumentaram por cá 11% nos últimos cinco anos, o que também passou despercebido e seria impossível sem mais produtividade.

Muito do debate económico continua confuso por questões laterais. Porque a economia é apenas uma coisa: pessoas que com trabalho, método e imaginação enfrentam as terríveis dificuldades da vida. Isso verifica-se por cá, hoje como sempre. O resto é conversa ociosa.

naohaalmocosgratis@fcee.ucp.pt

17/05/2004
 
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