Outros sites Medialivre
Caldeirão da Bolsa

Telefónica e Tabacalera - uma novela à espanhola...

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

Fair game

por Troiana » 25/11/2002 4:07

leprechaun Escreveu:Pessoalmente, e tal como os factos acima estão descritos, NÃO vejo nada de especialmente censurável no comportamento dos visados. É óbvio que tinham conhecimento de algo que não era ainda do domínio público e, com base nisso, foram acumulando acções sabendo seguramente que as mesmas iriam valorizar-se bastante. Creio que é este conhecimento privilegiado que está na base das acusações de que ambos são alvo.


A comparação pode parecer muito simplista, desajustada até, mas imaginemos um jogo de cartas. Pode até ser poker. Uma mesa cheia de jogadores. Basta que um deles, de alguma forma, consiga escolher as cartas que quer jogar para manipular o jogo a seu favor. Penso que a isto se chama batota. Ou jogo desleal.
Percebo perfeitamente que todos os investidores procurem vantagens competitivas e todos sabemos que a informação é uma delas - talvez a mais poderosa quando a temos antes de todos os outros. A questão, tanto no caso da Tabacalera como no do Miguel Cintra que o JAS refere, é que ambos tiveram acesso a informação. Mais: tiveram acesso a informação que podiam alterar/manipular. Tinham responsabilidades às quais fugiram. Eu chamo a isso jogo desleal, tão somente.
Quanto às fronteiras, não concordo que seja assim tão difícil defini-las com rigor. Estamos a falar de altos responsáveis de empresas que não podem desta forma descredibilizar o mercado. A lei é clara. O resto, é só uma questão de consciência. Aquilo que me parece justo é que todos os investidores possam usar de armas iguais no mesmo mercado.
That's all, folks! :wink:

Beijos e abraços,
Troiana
Avatar do Utilizador
 
Mensagens: 9
Registado: 5/11/2002 1:37

Re: Mas o que é o inside trading, afinal?!

por JAS » 25/11/2002 4:00

leprechaun Escreveu:Nos EUA, tais movimentos de compra e venda dos insiders têm que ser comunicados obrigatoriamente à SEC, creio, e o público em geral pode ter conhecimento deles passado alguns dias.


Caro leprechaun,

Como muito bem dizes os movimentos "têm que ser comunicados obrigatóriamente".

Lá como cá...

Quando não há comunicação é que infringem a lei...

E nos casos citados parece que aconteceu isso.

Um abraço,
JAS
Avatar do Utilizador
 
Mensagens: 6499
Registado: 5/11/2002 0:05
Localização: Lisboa

Mas o que é o inside trading, afinal?!

por leprechaun » 24/11/2002 5:02

Muito se fala neste tema, mas confesso o meu espanto em o ver continuamente assim focado.

Ou seja, quais são, afinal, os limites ou a fronteira para se considerar que determinado transação feita por alguém com interesses numa empresa é ou não crime de inside trading?

Pessoalmente, e tal como os factos acima estão descritos, NÃO vejo nada de especialmente censurável no comportamento dos visados. É óbvio que tinham conhecimento de algo que não era ainda do domínio público e, com base nisso, foram acumulando acções sabendo seguramente que as mesmas iriam valorizar-se bastante. Creio que é este conhecimento privilegiado que está na base das acusações de que ambos são alvo.

Ainda assim, repito que me custa a admitir que isso possa ser motivo de tanta indignação, que me soa mais a pura e simples inveja do que a outra coisa, ou seja, sentimento de justiça. Afinal, compraram e venderam acções no mercado aberto como qualquer um de nós, certo? E há sempre quem saiba as notícias antes de elas saírem a público, é evidente!

Ou seja, existe algum intervalo temporal a partir do qual a aquisição de acções pelos insiders não é considerada ilegal?! Nos EUA, tais movimentos de compra e venda dos insiders têm que ser comunicados obrigatoriamente à SEC, creio, e o público em geral pode ter conhecimento deles passado alguns dias. Por exemplo, eu dou grande valor a este tipo de informação, sobretudo em acções do sector tecnológico fortemente desvalorizadas, mas cujos quadros superiores acumulam maciçamente centenas de milhares de acções. Por certo, isso quer dizer algo. Bem, pelo menos acreditam na sobrevivência dessas empresas, o que já muito significativo. Como exemplos recentes, posso citar a Lucent, a Vitesse, a Nortel, a ADCT, a AMD, a Charter, a CNET, a McLeod, a Priceline, entre muitas outras, onde as compras "às carradas" se vêm efectuando desde há vários meses. Nalgumas até se acentuaram fortemente em Outubro e Novembro, havendo alguns casos - VTSS e MCLD - em que tais compras são quase diárias!!!

Pois bem, em que ficamos?! Será que os presidentes e administradores destas empresas têm ou não conhecimento de algum facto relevante - nem que seja de ordem puramente fundamental ou económica e financeira do grupo - ou serão puros especuladores que assim arriscam milhões de dólares em negócios que muitos comentadores consideram inviáveis, mais precisamente, condenados ao célebre Capítulo 11?! E se daqui a uns tempos existir uma OPA sobre alguma destas empresas - há rumores disso em relação à MCLD - a compra de tais acções poderá criar problemas aos seus detentores?! E por que razão, pergunto eu?!

Por fim, e trazendo à baila o caso da Imclone, mais o seu presidente e Martha Stewart, considero que, a haver crime - cuja tipificação ignoro, repito - então é bem mais grave quando o mesmo implica a perda do valor patrimonial das acções, com o consequente prejuízo para TODOS os accionistas, como no caso em apreço, do que o mero aproveitamento de circunstâncias favoráveis que vão fazer subir o valor das acções, caso em que só perde, por defeito, quem entretanto já as vendeu, num processo absolutamente normal num mercado aberto, claro!

Ora, é neste último cenário que se enquadram as duas notícias aqui apresentadas. Ambos ganharam muitos milhares? Parabéns! Crime de insider knowledge/information?! Mas... o que é isso, afinal?!

Em conclusão, continuo a não ver nada de censurável nos casos em apreço, a não ser que a lei já estabeleça limites temporais que devem ser respeitados por quem dispõe de informação priveligiada. E parece-me evidente que qualquer quadro superior de uma empresa sabe muitíssimo mais sobre ela e o seu real valor do que o Zé Povinho, obviamente!!!

Então, por que ficamos indignados, qual o motivo de reacções tão violentas?! Haverá mesmo algo de mais substancial que a tão humana e comezinha inveja?! Enfim, não me sinto nada prejudicado, enquanto pequeno accionista, com os exemplos acima apontados ou outros similares. De facto, e já que referi algumas acções do mercado norte-americano, considero mesmo que o conhecimento do "inside buying/selling" adicionado ao "short interest racio" constituem uma tremenda vantagem competitiva na negociação em mercados fortemente voláteis e emotivos, como o Nasdaq e companhia.

E, para isto não ser só paleio, posso referir os nomes de algumas empresas, que venho seguindo há uns tempos, passíveis de serem negociadas através de corretoras portuguesas - Bigonline e Caixa Directa Investe -, em que essas duas situações se verificam cumulativamente: um elevado "short interest" e fortes compras dos insiders. Ei-las:

Avaya (AV) Chordiant Software (CHRD) Lucent (LU) Reliant Resources (RRI) Akamai (AKAM) CNET Networks (CNET) Mirant (MIR) Nortel (NT) Sprint (PCS) Vignette (VIGN) e Vitesse (VTSS).

Do que tenho vindo a observar, considero mesmo que, só por si, estas são razões suficientes para comprar estas acções, pondo mesmo de lado factores de análise técnica ou fundamental. Claro que tal estratégia resulta melhor em períodos de subida dos índices, por facilitar o espectacular fenómeno do "short covering rally", com as consequentes subidas astronómicas de muitas dezenas por cento... ao dia!!! Já asssiti a isso em alguns dos títulos referidos e tal é bem agradável quando os detemos em carteira... :-)

Ainda assim, para aqueles que confiam na AT, posso ainda acrescentar que o site American Bulls tem recomendações de compra, para a próxima segunda-feira, dos seguintes títulos atrás citados e que beneficiam da "dupla vantagem" (indico a última cotação de fecho):

Avaya (AV) 3,12 $ Chordiant (CHRD) 1,95 $ Lucent (LU) 1,51$ Reliant Resources (RRI) 2,30$

Logo, atenção a estes 4 mosqueteiros! E como ainda estão em saldo, compram-se logo aos milhares!!! É que se algum deles desata a subir como um tolinho, basta um par de horas para se ganhar o que por estas bandas - leia-se PSI 20 - não se consegue em semanas! Claro que também podem descer, especialmente se surgir alguma notícia catastrófica, mas, na actual situação, e mesmo com alguma possível correcção dos mercados, o downside parece-me bastante limitado. No médio prazo - semana de Acção de Graças, sazonalidade do final de ano - as probabilidades jogam bem a favor dos Bulls. Ou seja, e sem querer soar demasiadamente optimista - you NEVER know for sure - é dinheiro em caixa, quase pela certa...

Pois bem, talvez seja por esta especulação desenfreada que eu não me sinto na pele de julgar ou condenar os tais casos mediáticos... Mas, visto que apenas sou um gnominho mui bullinho... ;-)

Rui leprechaun

PS: Hum... e fazer-se passar por tolo também tem as sua vantagens... mesmo nos negócios! :-) Citando o "sábio louco" do sufismo (ramo esotérico do Islão), o mullah Nasrudin:

"Não há nada de errado em se passar por tolo, se na verdade o que você está fazendo é inteligente." :)
leprechaun
 

Re: Telefónica e Tabacalera - uma novela à espanhola...

por JAS » 23/11/2002 15:05

Troiana Escreveu:A pergunta que me fica aqui a matutar é... se fosse em Portugal? 1) Alguém daria por isso? 2) Alguém faria alguma coisa? 3) Os responsáveis seriam penalizados por isso? 4) Inside Information... mas isso é crime? :shock: Sempre gostaria de saber que novela isso iria dar...


Por cá também há dessas novelas. Se isso vem ou não a ser considerado crime cabe aos tribunais decidirem...
Esta notícia do Expresso refere 2 casos.
JAS

Jornal Expresso-23/11/2002 Escreveu:Filho de Sousa Cintra julgado em Março

O JULGAMENTO de Miguel Sousa Cintra, filho do empresário José Sousa Cintra, foi marcado para os dias 20 e 24 de Março de 2003. Miguel Sousa Cintra é acusado de ter aproveitado informação privilegiada para ganhar dinheiro com acções da Vidago. O Ministério Público acusa-o de ter tido conhecimento do interesse da Jerónimo Martins (JM) em comprar a Vidago e de, com base nessa informação, ter feito uma série de compras de acções entre Julho e Outubro de 1996, para depois as vender à JM na Oferta Pública de Aquisição (OPA). No total, terá, segundo a acusação, obtido ilicitamente 800 mil contos (quase 4 milhões de euros) de mais-valias brutas nas ordens de compra dadas em 29 sessões bolsistas.

Miguel Sousa Cintra diz que só teve conhecimento de que a JM queria comprar a empresa «em cima do acontecimento». Afirmando-se «calmo e sereno» relativamente ao julgamento - e «convicto de que será feita justiça» -, refere que comprou as acções da Vidago apenas porque «estava com dinheiro disponível e acreditava na empresa». Acrescenta que era administrador não executivo e que só ia de vez em quando às reuniões do Conselho de Administração. Diz que está ser acusado por ser filho de Sousa Cintra, ressalvando que os seus negócios são e sempre foram independentes dos do seu pai. E defende que a acusação foi feita com base em «deduções».

Os factos remontam a Maio de 1996, quando começaram os contactos da JM com Sousa Cintra. O grupo de distribuição chegou a propor uma parceria na área da distribuição de águas minerais, da qual Miguel Sousa Cintra diz ter tido conhecimento. O seu pai recusou a parceria, mas mostrou-se disponível para vender a empresa. A JM terá respondido que apenas compraria a Vidago se ficasse a controlar mais de 90%.

De acordo com o Ministério Público, Miguel Sousa Cintra acompanhou todo este processo. Em primeiro lugar porque, embora «não tivesse qualquer pelouro específico, tomava parte em todas as reuniões do Conselho de Administração». A acusação refere que o Conselho de Administração foi informado logo em Julho dos contactos entre a Vidago e a JM. Por outro lado, a acusação diz que, enquanto administrador, o filho de Sousa Cintra teve conhecimento das negociações entre a JM e os três principais accionistas, precisamente porque ele era um desses accionistas. É que, sem o seu acordo, o negócio não ia para a frente, já que a JM condicionou o negócio à obtenção de mais de 90% do capital. Quando foi publicado o anúncio preliminar da OPA (11 de Novembro de 1996), Miguel Sousa Cintra tinha 22,23% do capital, o seu pai tinha 53,87% e um outro accionista, Amadeu Dias, tinha 15,7%. Ou seja, só seria possível chegar a acordo com a JM se Miguel aceitasse o negócio.

A acusação dá particular ênfase às ordens de compra dadas em Outubro, mês em que se intensificaram as negociações com a JM. No dia 4 desse mês, esta empresa propôs 3750 escudos por cada acção da Vidago, que veio a ser recusado, tal como foram recusados os 4000 escudos propostos a 17 de Outubro, até ter ficado acordado que o preço se fixaria nos 4300 escudos. Os movimentos suspeitos tiveram início a 18 de Julho, com a compra de um lote de 322.776 acções, tendo-se prolongado pelos meses de Agosto, Setembro e Outubro.

A marcação deste julgamento surge poucos dias depois de ter sido noticiado que o primeiro julgamento de manipulação do mercado, previsto para Dezembro, foi adiado. Este caso diz respeito a transacções feitas por José Manuel Zagallo com acções da ITI.
Pedro Lima
Avatar do Utilizador
 
Mensagens: 6499
Registado: 5/11/2002 0:05
Localização: Lisboa

Telefónica e Tabacalera - uma novela à espanhola...

por Troiana » 22/11/2002 20:13

Caríssimos,

é provável que muitos, sobretudo quem acompanha mais de perto o mercado espanhol, já se tenha dado conta dos apuros em que o actual presidente da Telefónica, César Alierta se meteu. Parece que o senhor terá ganho umas valentes mais valias através de "inside information"... O problema é que agora a Brigada Anti-Corrupção de 'nuestros hermanos' decidiu meter mãos à obra (ou na sopa... talvez seja o termo mais adequado estando nós a falar num caldeirão... :lol: ). E a coisa está mesmo a azedar para as bandas do senhor Alierta.

A avaliar pela explicação dos investigadores deste caso, o esquema usado passou pela acumulação contínua de acções da Tabacalera até cinco dias antes de 11 de setembro de 1997 - uma compra que estava a cargo do seu sobrinho. Nessa altura, Alierta anuncia dois factos importantíssimos: a subida do preço do tabaco e a aquisição do segmento de puros do grupo Havatampa por parte da Tabacalera. Resultado da operação: 1,86 milhões de euros em mais valias para os bolsos de Alierta, sua mulher e sobrinho.

A coisa parece estar a dar brado em Espanha e na Telefónica já se estão a fazer as contas à indemnização (decerto milionária) que o senhor Alierta levará pela sua mui contrariada auto-demissão.

A história é bem interessante e não resisti a partilhar convosco a informação (para quem procurar mais detalhes, aqui fica um link http://www.elmundo.es/elmundo/2002/11/22/espana/1037933802.html). O mesmo jornal, acrescente-se, que o senhor Alierta decidiu já castigar cortando todo o investimento publicitário. Mais: o presidente da Telefónica vetou a participação do director do jornal El Mundo num programa na Antena 3 (que pertence, precisamente, à Telefónica), como forma de represália. Claro que agora, para além das acusações de corrupção e inside trading, o senhor incorre também em acusações por ataque e ofensa à liberdade de imprensa.

Já agora, e se quiserem rir um 'poquito', deixo-vos só três reacções de cidadãos espanhóis a este caso... :wink: São um 'must'!

«Aparentemente en este pais es compatible aprovecharse de una posición privilegiada y lucrarse con ella. Este señor debía haber dimitido hace tiempo y pagar por esos abusos. Desafortunadamente en España las condenas no compensan el daño. Robar millones es más barato que robar miles. La ley deberia ser más severa.», José Olaya, Madrid

«Una persona que se aproveche de un puesto público, como Alierta, debe de sufrir la máxima pena y pasar en prisión el resto de su vida.. y que devuelva el dinero, por supuesto..!!!», Carlos, Munchen

«Pena de muerte para el y esterilizacion sexual para toda su familia. Es la unica forma de luchar contra esta plaga de ladrones.», licenciado en paro.

A pergunta que me fica aqui a matutar é... se fosse em Portugal? 1) Alguém daria por isso? 2) Alguém faria alguma coisa? 3) Os responsáveis seriam penalizados por isso? 4) Inside Information... mas isso é crime? :shock: Sempre gostaria de saber que novela isso iria dar...

E como isto já vai longo... por aqui me quedo! Hasta la vista, compañeros!

Besos,
Troiana
Avatar do Utilizador
 
Mensagens: 9
Registado: 5/11/2002 1:37


Quem está ligado:
Utilizadores a ver este Fórum: afcapitao, Bing [Bot], Goya777, Inácio Barreto, J.f.vieira, jcovas77, Jonas74, Kikoff, malakas, Masterchief, Metalor, morinni, PAULOJOAO, peterteam2 e 294 visitantes