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Limitar as Despesas Públicas

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

Limitar as Despesas Públicas

por TRSM » 17/2/2004 11:39

Limitar as Despesas Públicas

Limitar as Despesas Públicas
Subitamente assistimos a uma vaga de conversões ao princípio da fixação de limites plurianuais ao crescimento das despesas públicas. As conversões súbitas são sempre de desconfiar porque, normalmente, ou são falsas ou produzem zelotes.

Neste caso, estamos, na melhor das hipóteses, perante uma tentativa de super simplificação de um conjunto de questões complexas; na pior, assistimos a mais uma tentativa de não resolver os problemas, optando pela adopção de medidas drásticas que se assemelham às dietas e às sessões de exercícios físicos forçados que antecedem a época de praia, logo esquecidas uma vez chegado o Outono.

Dois pontos fundamentais mostram que das múltiplas propostas que têm surgido não poderá resultar a desejada reforma da despesas públicas em Portugal.

O primeiro respeita ao facto de os limites propostos serem não só transitórios, mas também cegos, quer aos desequilíbrios estruturais de partida, quer à situação conjuntural da economia.

O segundo refere-se ao desejo de comprometer a oposição com um limite, mas não com as medidas destinadas a fazê-lo cumprir.

Na prática, procura definir-se uma situação em que os fins - aceites por todos - justifiquem os meios, que o governo decidirá.

Uma solução deste tipo poderia ser defensável, como base de discussão, se se partisse de uma situação estruturalmente equilibrada e não estivessem em causa os procedimentos orçamentais que determinam ou, mais rigorosamente, que acomodam, as despesas públicas.

De facto, não é isso que acontece em Portugal, onde existe um claro desequilíbrio entre as despesas de consumo público e as transferências pecuniárias (correspondentes a pensões, subsídios de doença, de desemprego, etc.).

O sistema orçamental português, embora acomodando ambas, privilegiou as primeiras, levando a que o peso das transferências pecuniárias no PIB (13%) fique muito aquém da Zona Euro (17%).

Este desequilíbrio é tanto mais relevante quanto sabemos que, a médio e longo prazo, o envelhecimento da população vai acrescer o peso destas últimas. Além disso, também no curto prazo elas são um instrumento fundamental na estabilização da economia.

O subsídio de desemprego e as reformas antecipadas (muito mais discutíveis, mas que têm funcionado em Portugal como um substituto daquele) crescem em períodos de desaceleração da actividade económica e é bem possível que vão também crescer em função da reestruturação da actividade produtiva.

Embora exista alguma margem de manobra para melhorias de eficiência nesta área, não é daqui que podem esperar-se poupanças em matéria de despesas públicas, ao contrário do que sucede com as despesas de consumo, que incluem os gastos com pessoal.

Nestas a margem de manobra é grande, mas tem de lutar contra a velha lógica da acção colectiva. Segundo esta, grupos sociais com interesses comuns, que facilitam a sua organização e coesão, confrontados com uma política orçamental subordinada a objectivos político-eleitorais de curto prazo, extraem dela o máximo de vantagens.

Nomeadamente, beneficiam do apoio indiscriminado dos eleitores às despesas socialmente bem aceites, como é o caso das relativas à administração local, à educação, saúde, justiça e segurança, ou à luta contra a evasão fiscal.

Em todas estas áreas, o aumento dos gastos públicos tem sido muito superior ao proveito que a sociedade deles tem obtido, como quaisquer comparações com indicadores internacionais, ou até a simples observação do dia-a-dia, comprovam.

O que é indispensável para a resolução deste problema é uma radical mudança de incentivos que, à partida, exige a garantia de que as despesas desta natureza não vão poder adaptar-se às exigências dos grupos interessados, segundo o calendário eleitoral.

Isso implica uma actuação a nível macro e microeconómico. No plano macro será necessário definir normas de elaboração de orçamentos plurianuais que, com base em cenários prudentes de médio prazo, estabeleçam previsões para as receitas e, a partir delas, fixem limites para a despesa total por um mínimo de 3 anos, com sublimites para as áreas que exigem correcção, em particular as despesas com pessoal e as das administrações regional e local.

Ao mesmo tempo, haverá que estabelecer regras determinando que eventuais aumentos das receitas superiores aos previstos serão obrigatoriamente utilizados na redução da dívida pública e, para além de um montante a definir, na redução de impostos.

O exercício é revisto anualmente, deslizando o período de programação, mas não alterando os limites globais às despesas fixados nos anos anteriores, sob pena de se tornar em apenas mais um ritual.

Perante um enquadramento macroeconómico desta natureza, não haverá outro remédio que não seja alterar radicalmente os métodos de funcionamento da administração pública, pondo a ênfase na definição de responsabilidades de gestão e na sua descentralização, tornadas possíveis pela existência de um horizonte de decisão viável e pela subordinação a limites efectivos de despesas.

É óbvio que estamos perante a necessidade de consensos políticos, que requerem entendimentos de fundo, incompatíveis, por um lado, com negociações oportunísticas no Parlamento e, por outro, com a hostilização sistemática de grupos sociais que serão indispensáveis à solução.

Pode, é claro, imaginar-se uma estratégia alternativa que consista simplesmente em redistribuir os actuais benefícios, delimitando as clientelas políticas que deles são objecto. Difícil será, contudo, fazê-lo com o consenso da oposição ou dos visados.

2004/02/17 10:20:00
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